Analfabetismo funcional: o grande problema educacional da sociedade brasileira
A leitura e a interpretação de texto podem ser tarefas quase impossíveis para grande parcela da população brasileira.
Você sabe o que é analfabetismo funcional?
É a dificuldade (ou incapacidade) de ler e interpretar um texto ou fazer uma conta matemática que exija mais do que soma ou subtração.
Mesmo entre os estudantes universitários o analfabetismo funcional é um problema, já que nem mesmo os vestibulares são capazes de avaliar a capacidade de interpretação dos alunos.
Nesse artigo eu vou explicar para você o que é, como identificar e como melhorar os níveis de alfabetização, mesmo que você não tenha o hábito de ler sempre.
- O que é o analfabetismo funcional?
- O analfabetismo funcional na era digital
- O analfabetismo funcional e o mercado de trabalho
- O analfabetismo funcional na educação brasileira
- Para você melhorar sua interpretação de texto, temos algumas dicas
- Preste atenção ao que você lê
- Pratique a leitura o tempo todo
- Leia sempre com atenção
- Amplie seu vocabulário
O que é o analfabetismo funcional?
O analfabetismo funcional é a dificuldade de decifrar as entrelinhas de um texto, seu contexto, suas nuances e jogos de palavras.
A leitura mecânica, aquela relacionada a saber ler (juntar sílabas em palavras e palavras em frases) é bem diferente da leitura interpretativa, aquela que fazemos ao estabelecer semelhanças, criar deduções, etc.
Mesmo que a pessoa tenha frequentado uma escola ou uma universidade, ela pode ser incapaz ou ter muita dificuldade de compreender um texto.
Três entre cada dez brasileiros têm limitação para ler, interpretar textos, identificar ironia e fazer operações matemáticas em situações da vida cotidiana — e, por isso, são considerados analfabetos funcionais.
Esse problema atinge praticamente 30% da população entre 15 e 64 anos, cerca de 13 milhões de brasileiros, segundo o Indicador de Analfabetismo Funcional (Inaf).
O grupo atingido diminuiu um pouco, já que em 2001 representava 39% dessa faixa da população. Mas esse índice mostra que ainda estamos muito longe de poder comemorar.
Menos de 70% dos formandos em universidades são proficientes na leitura e produção de texto.
Apenas 8 em cada 100 pessoas no Brasil dominam a habilidade de leitura, interpretação e produção textual.
Isso significa que receber um diploma não é o mesmo que estar apto para o mercado de trabalho. Além de tudo, o analfabetismo funcional reduz oportunidades de inclusão social e empregabilidade — principalmente entre grupos que não são economicamente favorecidos.
O instituto classifica os níveis de alfabetismo em cinco faixas: analfabeto (8%) e rudimentar (22%) (que formam o grupo dos analfabetos funcionais); e elementar (34%), intermediário (25%) e proficiente (12%) (que ficam na classificação de alfabetizados).
Os dados do Inaf mostram que, entre o grupo de 29% dos analfabetos funcionais, 4% estão no ensino superior, nível de ensino em que se pressupõe um aluno plenamente alfabetizado.
A pesquisadora Ana Lima reforça que a escolaridade é o fator determinante do nível de analfabetismo, mas, ao mesmo tempo, ela não garante o que é esperado.
Mas por qual motivo isso acontece? Segundo especialistas, as políticas públicas educacionais foram ineficazes para tratar o problema, pois focaram apenas nas novas gerações e esqueceram que os hábitos de leitura vêm, muitas vezes, do exemplo da família.
Sua avó e seu avô são completamente alfabetizados? Seus pais? Seus tios? Para a maior parte da população brasileira, a resposta para essas perguntas é “não”.
Isso impacta negativamente na nossa educação, já que o acompanhamento por parte da família é essencial para o desenvolvimento das novas gerações.
O analfabetismo funcional na era digital
Existem grupos nas redes sociais voltados para o humor, em que as pessoas fingem ser mais velhas e escrevem errado, não interpretam textos corretamente e postam coisas sem sentido.
Pode ser engraçado para muitos, mas esse grupo existe como um reflexo do que acontece de verdade no nosso dia a dia.
Quem nunca passou vergonha com um comentário de alguma tia nas fotos? Ou com a avó que postou sem querer uma foto do pé e não conseguiu apagar?
O Inaf acompanha os níveis de analfabetismo no Brasil em uma série histórica desde 2001, mas, como uma novidade, trouxe informações relacionadas ao contexto digital.
O grupo de analfabetos funcionais reúne os analfabetos absolutos e os rudimentares, mas de acordo com as pesquisas, mesmo com todas as dificuldades, os analfabetos funcionais são usuários frequentes das redes sociais.
Entre eles, 86% usam o WhatsApp, 72% usam o Facebook e 31% utilizam o Instagram.
Dessa forma, quando comparamos os índices de uso entre os grupos de alfabetizados e não alfabetizados, a diferença não é tão grande. Entre os proficientes, 89% usam o Facebook.
A dificuldade de interpretação das informações, no entanto, coloca esse grupo em uma situação de risco.
"Essas pessoas não vão tirar proveito das redes sociais para conseguir informações, garantir direitos, porque não conseguem discernir conteúdos. Teriam a mesma limitação com um jornal escrito, por exemplo; a diferença é que estes, essas pessoas não vão acessar", afirma a pesquisadora Ana Lima, responsável pela elaboração do indicador.
Entre os analfabetos funcionais, 12% enviam mensagens escritas e escrevem comentários no Facebook, 14% leem mensagens escritas e 13% curtem publicações. Entre os proficientes, esses índices chegam a 47%.
Lima ainda diz:
"Quem tem mais domínio do alfabetismo usa mais o Facebook, mas o que chama a atenção é a diferença pequena (de utilização entre analfabetos e não), principalmente se você pensar na limitação de um analfabeto funcional. O Facebook está cheio de textos, imagens, exige escrita, por isso revela uma potência desses suportes digitais como estimulador do avanço do alfabetismo".
Já no aplicativo de mensagens quase não há diferença entre os usuários. Entre os alfabetizados, 99% utilizam o WhatsApp, enquanto 92% dos analfabetos funcionais fazem o mesmo.
Praticamente todos os brasileiros usam o WhatsApp, já que este é atualmente o meio de comunicação instantâneo mais eficaz.
Um dos reflexos do baixo nível de alfabetismo no contexto digital é que estas pessoas ficam mais vulneráveis à desinformação, especialmente memes, imagens manipuladas e usadas em contexto falso, segundo Christine Nyirjesy Bragale, vice-presidente de comunicação do The News Literacy Project.
"Obviamente elas têm uma capacidade limitada para checar através de pesquisa e leituras paralelas, e seu acesso a jornalismo impresso de qualidade é limitado", explica Christine.
Para a especialista, o primeiro passo é garantir que as pessoas, independentemente de seus níveis de leitura, compreendam que a desinformação pode vir por diferentes canais, incluindo imagens manipuladas e vídeos e se espalham rapidamente.
O analfabetismo funcional e o mercado de trabalho
De acordo com um levantamento, 6 bilhões de dólares por ano é o prejuízo aproximado da improdutividade gerada pela deficiência básica dos funcionários.
Essas atividades incluem leitura de manuais de instrução, normas de qualidade de segurança fundamentais para o trabalho, comunicados do departamento de Recursos Humanos, cursos e treinamentos que exigem estudo.
Agora, imagine um professor com dificuldades de compreender ou estabelecer relações entre mais de um assunto replicando o que sabe em uma sala de aula.
Pense que tipo de contribuição um parlamentar na mesma situação vai dar para a sociedade se existe uma limitação para decidir pela aprovação ou não de um projeto, lembrando que a educação depende muito do trabalho dos parlamentares.
Você consegue imaginar uma família semi-alfabetizada tentando ensinar uma criança a ler e escrever de forma efetiva? No nosso contexto atual de ensino a distância por causa da pandemia? É praticamente impossível dar certo.
O analfabetismo funcional na educação brasileira
Para conseguirmos melhorar os níveis de analfabetismo, precisamos de educação de qualidade.
Uma educação que consiga resgatar os alunos de um nível coloquial e mecânico, que os faça entender figuras de linguagem, ironia, metáforas.
Você acha que é um leitor pleno?
Nem mesmo um diploma pode garantir a alfabetização completa.
Para sair de uma universidade formado, o aluno deveria ser capaz de discutir, analisar, participar e debater diversos assuntos. Quantos graduados você conhece que são plenamente capazes de discutir assuntos diversos, mesmo fora da área de graduação?
João Batista Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto, diz que o cenário é desolador principalmente porque "melhorias não estão no radar."
"O prejuízo é gigantesco, porque compromete a produtividade da economia e as chances de a educação contribuir para a melhoria de vida das pessoas. Para as pessoas situadas entre os analfabetos funcionais, a perspectiva de vida é muito limitada. O Brasil optou pela quantidade, em detrimento da qualidade."
Brasileiros com mais tempo de estudo, apresentam melhores resultados
Segundo os dados do Inaf, quanto mais jovem é o grupo populacional analisado, melhores são os índices de alfabetismo, o que mostra a relação entre o tempo de estudo e a alfabetização.
Não é incomum ouvirmos dos mais velhos que o jovem precisa começar a trabalhar cedo e que estudar só até o 5º ano do Ensino Básico já é o suficiente (eu escutei isso de membros da minha própria família).
Mas é justamente esse pensamento que coloca o grupo do qual eles fazem parte, entre os mais vulneráveis.
Enquanto a taxa de analfabetismo funcional é de 53% entre os mais velhos (entre 50 e 64 anos), esse índice cai para 12% entre os mais jovens (de 15 a 24 anos).
Essa diferença deve-se à crescente expansão do número de crianças na Educação Básica pública no Brasil.
Em 2000, cerca de 95% das crianças brasileiras entre 6 e 14 anos estavam matriculadas na série adequada à sua idade no Ensino Fundamental, de acordo com o Anuário Brasileiro da Educação Básica de 2017.
Dessa forma, podemos concluir que a escolaridade é o principal fator explicativo para o nível da alfabetização, uma vez que, quanto mais alta a escolaridade de uma pessoa, maiores habilidades ela demonstra em lidar com a linguagem.
A porcentagem dos plenamente alfabetizados entre quem cursou o Ensino Superior (96%) é três vezes maior que entre os que concluíram apenas os anos iniciais do Ensino Fundamental (30%). Veja a tabela completa:
Para você melhorar sua interpretação de texto, temos algumas dicas
A leitura e a interpretação de texto, como vimos anteriormente, são tarefas difíceis para muitas pessoas, mas são habilidades importantes para a vida pessoal e profissional de todos.
Não saber interpretar corretamente um texto pode colocar a pessoa em uma situação de vulnerabilidade e pode gerar desemprego.
O mundo moderno exige diversas competências, e muitas delas estão ligadas a língua. Afinal, se você não conseguir interpretar um texto corretamente, como conseguirá fazer um curso e melhorar uma habilidade?
Uma interpretação de texto competente depende de inúmeros fatores, como contexto social, educação básica e até mesmo a educação da sua família, mas não é impossível melhorar esse aspecto por conta própria.
Preste atenção ao que você lê
Na correria do dia a dia, as vezes as informações passam batidas se você não se atentar aos detalhes.
Interpretar demanda paciência, por isso sempre releia o que você conseguir, uma segunda leitura pode apresentar novas interpretações.
Leia com cuidado e certamente correrá menos risco de tornar-se um analfabeto funcional e, claro, leia com atenção, pois é um exercício que deve ser praticado à exaustão, assim como uma técnica.
Pratique a leitura o tempo todo
Não é de hoje que falamos neste blog sobre a importância de praticar a leitura todos os dias.
Neste texto eu apresentei muitos dados que comprovam que a leitura é essencial para a nossa vida em sociedade.
Por isso, leia de tudo. Leia sempre. O tempo todo, se puder.
Não se baseie em apenas um veículo de leitura. Ler livros é ótimo, mas tente ler notícias de jornal, blogs, folhetos, outdoors, propagandas, bulas de remédio, etc.
Se você acha que não consegue entender o contexto quando lê materiais muito longos, entre para um clube do livro ou algum grupo de leitura em conjunto. Nesses grupos você consegue discutir as interpretações e assim melhorar a forma como você entende os textos.
Leia sempre com atenção
Não adianta querer ler o tempo todo se você nunca parar para prestar atenção.
Concentre-se na ideia que o autor do texto quer passar. Pense sobre os argumentos que ele utilizou, discuta com as palavras, veja se você concorda ou não com os pontos apresentados.
Crie suposições para os textos, mas sempre se baseie em fatos ou argumentos sólidos. Fazer isso melhora sua capacidade argumentativa, e com isso, sua capacidade de interpretação.
Observe com muita atenção o sentido das frases.
Lembre-se que um dos maiores danos causados pelo analfabetismo funcional é a vulnerabilidade em que este problema coloca as pessoas. Não acredite cegamente em tudo o que você vê online, sempre questione.
Com o fluxo constante de informações, é muito fácil absorver apenas superficialmente os conteúdos apresentados. Informe-se melhor sempre.
Amplie seu vocabulário
Qualquer leitura ajuda a ampliar o vocabulário, mas existem outras formas tão eficazes quanto.
Você pode ampliar seu vocabulário com jogos, como os caça-palavras, jogos de curiosidades como o Master e cruzadinhas.
Existem vários aplicativos para celular que podem auxiliar você nessa tarefa, como o CodyCross, que eu particularmente amo e jogo sempre. A vantagem dele é que além de gratuito, você não precisa de internet para jogar.
São inúmeros os benefícios que a leitura pode proporcionar, não apenas interpretar textos, mas também entender o contexto da sociedade.
Quem não consegue interpretar textos corretamente, não consegue entender as notícias e pode ser manipulado facilmente por quem sabe.
Preste atenção e estude muito para não cair nas armadilhas da nossa língua. Vamos tentar acabar com o analfabetismo funcional juntos.
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